Depois de Uber, alvo agora é WhatsAppVamos fazer logo uma petição contra a luz elétrica em defesa dos produtores de lampiões!
Leio a seguinte notícia:
Operadoras de telecomunicações no Brasil pretendem entregar a autoridades locais em dois meses um documento com embasamentos econômicos e jurídicos contra o funcionamento do aplicativo WhatsApp, controlado pelo Facebook, disseram àREUTERS três fontes da indústria.
Uma das empresas do setor estuda também entrar com uma ação judicial contra o serviço, afirmou uma das fontes.
O questionamento a ser entregue à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) será feito contra o serviço de voz do WhatsApp, e não sobre o sistema de troca de mensagens do aplicativo, disse a mesma fonte.
A ideia é questionar o fato de a oferta do serviço se dar por meio do número de telefone móvel do usuário, e não através de um login específico como é o caso de outros softwares de conversas por voz, como o Skype, da Microsoft.
“Nosso ponto em relação ao WhatsApp é especificamente sobre o serviço de voz, que basicamente faz a chamada a partir do número de celular”, disse a fonte, que assim como as outras duas falou sob condição de anonimato.
“O Skype tem identidade própria, um login, isso não é irregular. Já o WhatsApp faz chamadas a partir de dois números móveis”, acrescentou.
O argumento das operadoras é que o número de celular é outorgado pela Anatel e as empresas de telefonia pagam tributos para cada linha autorizada, como as taxas do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), o que não é feito pelo WhatsApp. De acordo com a consultoria especializada Teleco, as operadoras pagam 26 reais para a ativação de cada linha móvel e 13 reais anuais de taxa de funcionamento.
Um espanto! Depois do ataque ao Uber, agora o alvo é o WhatsApp, que tem sido usado cada vez mais para substituir as ligações. Onde já se viu? Onde isso vai parar? Todos podendo se comunicar com o mundo todo por um valor irrisório? Inadmissível! Absurdo! Vamos usar o governo para proteger a indústria, os empregos. Os consumidores não podem desfrutar desses avanços tecnológicos que prejudicam as empresas estabelecidas!
Pois é, parece piada… Resolvi até resgatar um artigo que publiquei no GLOBO em que criei minha primeira ONG fictícia, já que às vezes só nos resta mesmo a sátira:
Uma petição nacionalista
Em memória de Frédéric Bastiat.
Prezados ministros, ilustre presidente Dilma. Venho, aqui, apresentar uma petição em nome da Associação Brasileira dos Produtores de Coisas Obsoletas (ABPCO). Tendo observado atentamente as últimas medidas do governo, tal como a elevação do imposto para carros importados, não pude deixar de notar um claro viés mercantilista.
O governo, finalmente, assume sua postura nacional-desenvolvimentista, que busca proteger produtores nacionais da concorrência externa. Objetivo deveras legítimo. Afinal, faz-se mister garantir os empregos dos brasileiros, não dos chineses ou coreanos. “Quem ama protege”, disse Carlos Lessa. E é justamente com base neste nobre ideal que vos apresento esta humilde petição.
A ABPCO representa produtores de carroças, máquinas de escrever, gramofones, lampiões, tudo aquilo que foi injustamente prejudicado pelo avanço da tecnologia capitalista, importada de outros países. Pergunto: é justo um produtor de máquinas de escrever ir à falência só porque inventaram o computador?
Alguns liberais podem argumentar que o computador trouxe inúmeros benefícios para todos os consumidores, gerou produtividade maior na economia e ajudou no progresso da nação. Mas, e quanto aos empregos de todos aqueles pobres trabalhadores envolvidos na manufatura das máquinas de escrever? Como eles ficam sem proteção?
Como representante da ABPCO, regozijo-me ao saber que Vossas Excelências não sois insensíveis como os liberais. Vós compreendeis a importância de se proteger os empregos dos produtores nacionais, ainda que seus produtos sejam piores e mais caros.
Muitos empresários argumentam que o “Custo Brasil” é alto demais, que não é justo competir com esta infraestrutura, alta taxa de juros, burocracia asfixiante e impostos escorchantes. São reclamações legítimas. Mas o que o governo pode fazer? Reformas estruturais? E como fica a governabilidade? O governo vai reduzir seu raquítico gasto público, de um trilhão de reais? E como ficariam aqueles que dependem do governo? Políticos, burocratas, centrais sindicais, MST, ONGs, empreiteiras e milhões de famílias que vivem do Bolsa Família…
Aliás, permitam-me um parêntese: parabéns pelo recente anúncio do aumento de beneficiados com este programa. Já são quase 14 milhões de famílias! É assim que um programa social, que tem como meta reduzir a miséria, deve ser julgado: quanto mais gente depender do governo para viver, maior o seu sucesso. Maravilhoso será o dia em que todos estiverem no programa. Seremos tão ricos quanto Cuba!
Mas divago. Devo regressar à crítica dos empresários. O governo teria que demitir funcionários, e sabemos como os serviços públicos hoje são excelentes, justamente por conta do enorme aumento no quadro de pessoal durante a gestão petista. A saúde pública, segundo o ex-presidente Lula, é quase perfeita. Esta é uma conquista importante que não podemos abrir mão. Escolas excelentes, transporte público de primeira, segurança, e vamos sacrificar isso tudo só para permitir juros menores?
Creio que o caminho escolhido por vosso governo é mais sábio: decretar a redução dos juros na marra, mesmo sem cortar gastos públicos; aceitar mais inflação (o que são míseros 7% ao ano?); aumentar impostos; direcionar crédito subsidiado do BNDES para grandes empresas; e, claro, proteger o produtor nacional.
Alguns ousam chamar o aumento do IPI de protecionismo. Um disparate! O ministro Pimentel soube dar uma resposta à altura: argumentou que não é protecionismo porque as importações não foram proibidas. Brilhante! E é justamente pegando carona nesta lógica impecável que gostaria de propor, em vez de proibir a importação dos concorrentes, uma singela tarifa de 1.000% (o número é arbitrário; aceitamos 900%). Ninguém poderá acusar vosso governo de protecionista.
Finalizo esta petição confiante de que o governo será sensível à demanda dos produtores em questão. Empregos estão em jogo. Não podemos sacrificá-los apenas para o benefício dos consumidores, que, como bem colocou o ministro Mantega, sofrem assédio dos importados.
PS: gostaria de vos alertar quanto a uma campanha que circula na internet, de boicote aos carros nacionais após o aumento do IPI. Se os consumidores deixarem de trocar de carro até o fim do ano, os estoques poderão subir muito, entupindo os pátios das montadoras. Seria terrível para o governo. Mas não fiqueis tão preocupados. O povo é nacionalista. Quem ama o país está disposto a comprar até carroça nacional pelo preço de Ferrari. Contamos com isso…
Rodrigo Constantino
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