O silêncio de DilmaBater de frente com Eduardo Cunha, autor do projeto que dificulta o aborto no Brasil em caso de estupro, não convém à presidente

Parte do trabalho de um presidente é falar. Nos Estados Unidos, por exemplo, estuda-se há muito tempo o poder de persuasão presidencial através da retórica. Este poder compensaria a falta de prerrogativas legislativas do cargo, pois o presidente americano só pode vetar leis (não as iniciar, embora na prática isso acabe acontecendo) e editar alguns decretos pouco relevantes. Mas mesmo em um sistema político com presidente constitucionalmente forte, como o Brasil, a retórica é importante para sinalizar vontades presidenciais.
Como entender, a partir disso, o silêncio de Dilma sobre o projeto de lei 5.069/2013? Essa proposta torna obrigatória a comprovação prévia de abuso sexual por meio de exames antes da realização de abortos em casos de gravidez resultantes de estupro – o que é permitido no Brasil. Na prática, se aprovada a mudança na legislação, aumentará o número de mulheres que darão luz aos filhos de seus estupradores, pois comprovar abuso sexual está muito, muito longe de ser simples.
É injusto, antes de mais nada, acusar os governos petistas de não darem a devida atenção às políticas públicas que afetam mulheres. (Aliás, este projeto fere os direitos humanos, não apenas os das mulheres.) O PT criou a Secretaria de Políticas para as Mulheres em 2003. Apesar de não ter sido uma secretaria com o devido orçamento e recursos humanos necessários, é inegável que o poder simbólico de uma instituição assim é grande.
Dilma não fala sobre este projeto polêmico por dois motivos. O primeiro é que não convém enfrentar Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o autor da proposta, quando ele pode decidir, sozinho, se haverá processo de impeachment contra ela.
Além disso, seria difícil a presidente justificar atenção a um tema que, no momento, é infelizmente secundário. Afinal, para que mulheres consigam garantir seus direitos no Brasil, é necessário haver um país. Sem CPMF e o alongamento da DRU, não haverá. Do jeito que a política fiscal anda, não seria inadequado repetir a galhofa que Stephen Colbert fez com Donald Trump: ela pode ser a última presidente da história do Brasil.
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